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Para que serve a Semana Nacional de Trânsito?

É chegada a data em que há uma maior audiência dos meios de comunicação e redes sociais relativo a um tema de tamanha importância para todos, porém esquecida por muitos, a segurança no trânsito.

Mas afinal, você sabe qual é o propósito dessa data?

Poderíamos discorrer historicamente que a SNT[1] foi retomada como data representativa de ações de segurança viária em decorrência da promulgação do código de trânsito brasileiro em 1997 que trouxe diversas mudanças referentes à fiscalização, punição e educação para o trânsito e todas as suas ramificações.

Porém neste artigo pensamos em aprofundar melhor as responsabilidades que não estão na cartilha. Aquilo que sabemos que devemos fazer, desejamos que ocorra, mas não agimos para que mude nas vias de nossas cidades.

É notório que educação e desenvolvimento nunca foram matérias primordiais em nosso país. Haja vista que o Brasil foi a última nação das Américas a ter uma Universidade, apenas no século XX. Podemos então nos deparar com um fato que encontramos logo ao sair de casa, a conturbada relação humana de poder transfigurada em meios de locomoção.

Dentro desse jogo de cartas marcadas temos players[2] que se portam com alguns atos previsíveis como o governo, as empresas, os especialistas e a população.

Para determinados órgãos governamentais a SNT representa apenas uma data programada para apresentar números e projetar ações, dentre as quais muitas nunca saem do papel.

Para as empresas a semana serve no engajamento de algumas áreas ou como pano de fundo para campanhas internas, porém pouco aproveitadas caso não tenham interligação com demais departamentos ou com a realidade pré e pós jornada de trabalho.

Para os especialistas a data serve para traçar uma linha sobre a teoria e a prática, entretanto com prudência, para que não seja apenas um portfólio de vaidades.

E para a população, esta sempre escanteada, a SNT passa despercebida numa velocidade tão grande quanto o coletivo que abarrotado não para no ponto para o trabalhador pegar sua condução logo cedo.

Deste modo elucidaremos uma visão sintética sobre a correlação segurança, cultura e desenvolvimento e o convidamos a refletir conosco qual o seu papel nesse cenário.

Pelo mundo afora

“Pensar o passado para compreender o presente e idealizar o futuro”

Heródoto 485-425 a.C

Olhar para o passado nos permite não errar no futuro e de maus exemplos o Brasil está cheio. Tanto que começamos um código de trânsito mais robusto e integrado apenas no final da década de 1990, com obrigatoriedades e punições mais severas aos motoristas infratores e também aos próprios órgãos reguladores.

Os Estados Unidos e outros países da Europa remontam suas ações educativas ao trânsito anteriormente, por início das décadas de 1940 e 1950. Mesmo aqueles que começaram após essa data, investiram bastante em inteligência de gerenciamento de dados e ações na construção de vias mais seguras, tornando-se assim referências mundiais.

O fomento a uma cultura de paz no trânsito foi crucial para o desenvolvimento dessas nações, uma vez que locomoção é parte radical das relações sociais e de trabalho.

Qualquer país deveria se inconformar com números de mortes no trânsito maiores ou similares aos de guerra, propondo deste modo mudanças sólidas na gerência de suas vias.

Olhar para o presente nos ajuda a ter métricas atuais de objetivos a serem alcançados. Em 2011 foi lançada a [Década de Ação pela Segurança no Trânsito 2011-2020]; uma ação global encabeçada pela ONU[3] na qual seus países Estados membros pactuaram uma série de medidas para a redução das mortes e sequelas no trânsito.

O número almejado é a redução em 50% dos óbitos derivados dos acidentes de trânsito. Conjuntamente com uma agenda para até 2030 sobre desenvolvimento sustentável que visa diversas ações relativas à melhoria na qualidade dos transportes.

O apelo e compromisso não ficam somente aos governos, mas também às agências internacionais, às organizações da sociedade civil, empresários e líderes comunitários que assegurem que a Década possa gerar melhorias evidentes.

Em alguns países como o Japão, os diálogos e projetos buscam o índice de morte zero no trânsito até 2030 através de carros autônomos e montadoras como a Volvo buscam esse ideário a partir de 2020 aos tripulantes de seus automóveis.

Com isso o desenvolvimento de um olhar para o trânsito seguro possui diversos atores e metas claras, mostrando um horizonte de possibilidades reais.

Qual o seu papel?

Notamos que todos os elementos dessa relação: governo, empresas, especialistas e população; têm obrigações e devem agir para criar condições sustentáveis a uma melhor locomoção.

Entretanto, nesse exercício reflexivo queremos eleger um desses participantes, que em alguns momentos fica longe dos holofotes no debate, para não somente destacar suas responsabilidades, mas também fornecer direção de como contribuir para um novo olhar ao tema, tornando-se assim protagonista na transformação social de uma cultura de segurança e respeito à vida: O setor privado.

Este, que move em grande parte a relação de trabalho dentro de um país, possui em suas diretrizes e valores nobres dentre os quais inúmeros se encaixam nesse tema.

Partindo exatamente de tais conceitos podemos desenvolver em uma empresa uma cultura organizacional voltada para conscientização e educação no trânsito que se reflita para fora dos muros da fábrica gerando um ciclo de segurança que acompanhe toda rotina do colaborador e se complete trazendo não só a ele, mas também ao coletivo social uma melhor qualidade de vida.

Afinal os meios de produção já possuem em seus cronogramas internos uma série de mecanismos para cumprimento de metas de segurança tais como SIPAT[4], controladoria, treinamentos, auditorias, análise de dados, ISO[5]; dentre os quais visam uma melhor produtividade e rentabilidade empresarial.

Os gestores, portanto, devem utilizar esses mecanismos para estabelecer uma conjuntura mais robusta e prática no conhecimento e atitude de seus colaboradores.

Devemos aqui fazer uma ressalva à aquelas corporações que já possuem  gestos claros de desenvolvimento sustentável humano e contribuem para o tema.  Porém ainda há um campo muito vasto para se trabalhar o assunto pelo país, pois a carência de informação e formação tem gerado problemas críticos.

Isso ocorre em diversas empresas, possivelmente por desconhecerem estatísticas impressionantes do Brasil, como a perda de 90 a 120 vidas no trânsito por dia, segundo dados do Ministério da Saúde e do Conselho Federal de Medicina.

Ou ignorar que cerca de cinco pessoas em média estão ligadas a um acidente de trânsito na forma de vítima ou de cuidados aos feridos e sequelados.

E esses sobreviventes, em sua grande maioria na idade produtiva, também contribuem negativamente para um amontoamento dentro das internações hospitalares, gerando assim gastos públicos altíssimos na ordem de R$ 146,8 bilhões por ano, segundo CPES[6] e impactando então na produtividade da própria empresa devido ao absenteísmo que dura em média 15 dias podendo ser maior de acordo com a gravidade do acidente.

Ao ignorar esses dados, muitas corporações não se atentam aos gastos reais e imediatos que o próprio setor privado tem de arcar a partir de um acidente. Trazendo também ao trabalhador marcas psicológicas que podem durar por anos.

“Se você acha que educação é cara, experimente a ignorância.”

Derek Bok 1930-atualmente

Portanto o ponto inicial que qualquer empresa deve se atentar na busca de maior rentabilidade, é o investimento na qualidade da capacitação de seu funcionário.

Optando por um treinamento interno ou externo, é imprescindível buscar profissionais experientes para tratar sobre um assunto tão complexo.

Hoje não podemos apenas nos fixar às regras de trânsito, pois elas sozinhas não garantem a prevenção de acidentes, mas sim compreender que um comportamento seguro é frutos de educação e hábitos constantes. Esses quais podem ser aprendidos e devem ser estimulados na empresa.

Treinamentos teóricos e práticos, palestras e campanhas, são alguns exemplos de ações que devem estar na pauta dos gestores que buscam maior êxito em seus processos.

Outro ponto que não podemos perder de vista é a abordagem de situações reais de seus colaboradores, ou seja, partindo do concreto para estipular ações eficientes a um determinado problema recorrente ou que gere potencial risco.

Tudo isso é possível através da coleta e tratamento de dados e informações. Não despreze indicadores formais como números de acidentes de frota ou SAC[7] ou até os informais como o ‘papo no cafezinho’. Eles podem revelar um cenário que talvez você ainda não conheça.

E claro, lembre-se que periodicidade é fundamental para uma atualização eficaz. Uma vez também que o ciclo de novos funcionários ocorre com certa frequência e todos devem falar a mesma língua.

Qual a sua marca?

Empresas que não vislumbram um horizonte de educação para o trânsito e comportamentos sustentáveis ficam à deriva das conexões atuais com mundo.

Tecnologia, redes sociais, fóruns especializados e a própria mídia tradicional dão notoriedade às ações de diversos setores produtivos.

Atualmente uma companhia que sofre problemas em seus processos internos pode ser exposta através da internet em uma velocidade ímpar. A partir de documentos, fotos ou vídeos feitos por celular que comprovem uma ação ilegal ou imprudente por parte de seus colaboradores, a empresa corre o risco tanto de sofrer autuações como também ser afetada negativamente pela opinião pública trazendo até mesmo boicotes ao seu negócio.

Deve-se então compreender quais “marcas” sua corporação tem deixado na sociedade. A imagem que seu colaborador transmite é reflexo das ações que a empresa valoriza.

Quando planta-se um germe real de segurança dentro do ambiente empresarial, ele floresce não somente nas práticas em seus próprios domínios, mas também em seus arredores e ramificações. Cria em si mesmo uma realimentação sustentável e duradoura transmitida através de seus stakeholders[8] gerando assim empatia, credibilidade e competitividade.

Plante agora e colha também

“Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.”

Cora Coralina 1889- 1985

Chegamos então à Semana Nacional de Trânsito discutindo responsabilidades, mas principalmente provocando atitudes em forma de conhecimento.

Como sabemos é notória a força e influência que o setor privado detém e como pode realizar transformações profundas em nosso país, uma vez que compreenda os benefícios que uma boa formação e educação trazem não só a si próprias como organizações, mas como um círculo de desenvolvimento completo.

Formar, informar e educar, são bases para rompermos barreiras que o individualismo, refletido desde as escolhas por um transporte individual ou até o isolamento na tela do celular, tem trazido em nosso mundo.

O trânsito é apenas uma face de nossa sociedade.  É o campo onde vontades particulares se sobrepõem muitas vezes aos interesses coletivos e, portanto, é necessário enxergar o próximo com empatia e construir um ambiente mais colaborativo.

Nesta semana, não fiquemos apenas no campo das possibilidades, mas partamos para a ação efetiva.

Distribuir folhetos por alguns dias em nome da SNT, achando que será o suficiente para extinguirmos uma epidemia de mortes no trânsito é desvalorizar o tema e desconhecer a transformação que educação de qualidade pode proporcionar.

Reflita então se sua empresa tem vislumbrado algo tão fundamental quanto o investimento feito no ser humano e se ela está aplicando e influenciando em seu meio novas e melhores práticas de segurança no trânsito e bem estar.

Não espere pelo outro para fazer a diferença. Tome o primeiro passo em direção a um trânsito melhor, porque tudo isso voltará para você de alguma forma.

Pensar em segurança é amar a vida e quando os créditos sobem os protagonistas são os primeiros a serem aplaudidos.

 Boa Semana Nacional de Trânsito!

 

Legenda 

[1] SNT- Semana Nacional de Trânsito

[2] Palavra inglesa para participantes ou jogadores.

[3] Organização das Nações Unidas.

[4] Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho

[5] Sigla em inglês de Organização Internacional para Padronização

[6] Centro de Pesquisa e Economia do Seguro

[7] Serviço de atendimento ao consumidor

[8] Público estratégico e descreve uma pessoa ou grupo que tem interesse em uma empresa, negócio ou indústria, podendo ou não ter feito um investimento neles.